O desastre de Tchernóbil, ou Chernobyl, foi um acidente nuclear catastrófico que ocorreu no dia 26 de abril de 1986, resultado de uma falha humana.
A tragédia foi considerada o pior desastre nuclear da História, com trinta e uma mortes diretamente ligadas ao episódio, mas com efeitos de radiação que até hoje afetam milhares de pessoas.
A cada ano ainda é registrado nas redondezas casos de câncer, disfunções neuropsicológicas e mutações genéticas consequentes do superaquecimento e explosão do reator radioativo.
Vozes de Tchernóbil: um livro sobre revolta e resistência
A obra “Vozes de Tchernóbil”, escrita pela jornalista ucraniana Svetlana Aleksiévitch, vencedora do Nobel de Literatura 2015, não é um livro sobre a catástrofe de 1986, mas sim uma história sobre luto, revolta e resistência dos sobreviventes.
Segundo a autora, já existem milhares de registros sobre o desastre em si, incluindo produções culturais que se aproveitam da tragédia para vender e chocar o público.
Ao contrário disso, essa obra não apropria elementos do evento para torná-lo em sensacionalismo, ela debruça-se sobre o repertório escondido nas experiências das milhares de pessoas afetadas pela radiação, pela morte e pelo descaso.
O sentimento de luto da comunidade de Tchernóbil é emitido para o leitor por meio da rotina e do cotidiano de quem perdeu filhos, parceiros e amigos.
De quem precisou abandonar suas casas, trabalho, animais de estimação e todos os seus pertences, não importa o quão valiosos eram.
O sofrimento registrado no livro não vem do interesse de um cenário apocalíptico, comumente retratado em filmes e pela ficção, mas sim da realidade de quem considerava Tchernóbil como casa.
No monólogo que introduz o livro, intitulado de "uma solitária voz humana”, conhecemos a história de Liudmila Ignátienko e Valentina T. Apanassiévitch, mulheres que acompanharam seus maridos após o acidente nuclear.
Foi uma rica escolha para introduzir a obra, pois, pelo relato em primeira pessoa de uma das mulheres, é contextualizado o sofrimento, desespero e confusão das pessoas diretamente afetadas pela radiação, dos profissionais de saúde, dos familiares e dos outros moradores da comunidade.
É ratificado inúmeras vezes o amor imensurável que a mulher tem pelo seu marido bombeiro, internado em condição crítica após ficar trabalhando nas proximidades do reator sem o uso de nenhum equipamento de proteção ou aviso de perigo.
Através das palavras da narradora e do registro de Svetlana, é possível compreender o terror que a tragédia de Tchernóbil facultou, especialmente pela forma explícita e pesarosa que as consequências da radiação no corpo humano são descritas pela entrevistada:
O meu marido começou a mudar; cada dia eu via nele uma pessoa diferente... As queimaduras saíam para fora... Na boca, na língua, nas maçãs do rosto; de início eram pequenas chagas, depois iam crescendo. As mucosas caíam em camadas, como películas brancas. A cor do rosto, a cor do corpo... Azulada... Avermelhada... Cinza-escuro... E, no entanto, tudo nele era tão meu, tão querido!(p.23)
A autora, ao compor o livro com uma melodia diversa de vozes, aponta a nova realidade criada após a luta contra inimigos invisíveis que “tocavam a relva ceifada, o peixe pescado, a caça aprisionada, as maçãs…”, mas que assopravam o mesmo pavor que uma guerra militar.
Os personagens da tragédia têm sua voz ouvida e registrada de forma fiel e sensível por Svetlana, que apresenta relatos cada vez mais tocantes ao longo da obra.
Durante a leitura, percebemos que o acidente deixa marcas atemporais, com consequências que estão presentes décadas depois e que permanecerão por um longo tempo.
Somos lembrados da capacidade de destruição do ser humano, e como os erros do passado devem ser revistos para impedir que se repitam.
Assim, Vozes de Tchernóbil configura-se como uma leitura difícil, mas obrigatória para todos que desejam experienciar uma obra envolvente sobre memória, pesar e, no fim, superação.
VOZES DE TCHERNÓBIL: garanta o livro
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