Os ministros do TCU (Tribunal de Contas da União) decidiram nesta quarta-feira (17) dar um prazo de 30 dias para que a presidente Dilma Rousseff se explique pessoalmente sobre irregularidades apontadas pelo órgão na prestação de contas do governo de 2014.
É a primeira vez que o tribunal convoca um presidente a se explicar.
A posição do relator das contas de gestão, ministro Augusto Nardes, de pedir explicações à Dilma, foi seguida por unanimidade pelos oito ministros votantes. O receio da corte de reprovar as contas sem ouvir a presidente era o de que o Palácio do Planalto recorresse à Justiça alegando não ter tido o amplo direito de defesa e derrubasse uma possível decisão contrária ao governo.
Em seu voto, lido por pouco mais de uma hora, Nardes afirmou que irregularidades cometidas no ano passado em relação aos gastos públicos impedem a aprovação das contas de Dilma.
"As contas não estão em condições de serem apreciadas em razão dos indícios de irregularidades. Não foram fielmente observados os princípios legais e as normas constitucionais", disse.
Antes da anunciar a decisão, ele fez um discurso duro sobre os problemas apresentados nas contas de 2014. "Todos devem se submeter ao império da Lei. Não podemos agir diferente se quisermos consolidar a democracia brasileira", afirmou.
FALHAS - Técnicos do TCU apontaram várias irregularidades, incluindo as chamadas "pedaladas" fiscais, que permitiram ao governo segurar despesas com ajuda dos bancos públicos que pagam, por meio de transferências, benefícios como Bolsa Família e Minha Casa, Minha Vida.
"É preciso dar um basta nisso", disse Nardes, apontando que em 2014 R$ 37 bilhões dessas dívidas foram escondidas.
"A Lei de Responsabilidade Fiscal não pode ser jogada pela janela."
No total, as dívidas escondidas pelo governo em 2014 com bancos e fornecedores chegam a R$ 256 bilhões.
O relator também apontou que o governo foi avisado de que teria que cortar despesas e, mesmo assim, aumentou gastos no último ano do governo, quando a presidente tentava a reeleição.
Atos pessoais de Dilma, como a emissão de decretos aumentando despesas sem autorização do Congresso, também foram considerados ilegais e colaboraram para o voto contrário de Nardes.
PRESSÃO - Os ministros sofreram fortes pressões ao longo da semana. Emissários de Dilma tentaram convencer o tribunal a aprovar as contas, enquanto integrantes da oposição, como o senador Aécio Neves (PSDB-MG) -que perdeu para Dilma a última eleição presidencial-, defenderam sua reprovação.
A rejeição das contas pode prejudicar a imagem externa do país, aumentando a desconfiança dos investidores sobre os números do governo, e criar dificuldades políticas, oferecendo nova justificativa para líderes da oposição que defendem o impeachment da presidente.
Seja qual for o resultado final do TCU, o parecer é encaminhado ao Congresso Nacional, onde os parlamentares podem manter ou alterar a decisão da corte.
CRÍTICAS - O relator foi duro em suas críticas ao governo, insinuando que faltou "verdade" nos gastos públicos.
"Qual o Brasil que queremos? Um Brasil que o Estado comanda tudo, para de investir e o país para, como estamos vivendo hoje? [Queremos] Um Brasil de credibilidade, de confiança, de respeito internacional nas instituições. Precisamos de verdade para realizar esse desejo. Verdade na gestão dos recursos públicos, na demonstração no emprego do dinheiro do povo brasileiro", disse.
Nardes atribuiu os problemas da economia nacional ao desrespeito com as contas públicas, já que o governo teve deficit em 2014 de R$ 22 bilhões nos seus gastos primários.
"O que mostramos leva a um círculo vicioso de baixo crescimento, inflação alta, despesa pública alta e investimento baixo, deficit fiscal, criando a incerteza que vivemos hoje", disse.
O ministro do TCU ainda elogiou o ministro Joaquim Levy (Fazenda), dizendo que ele "está tentando fazer consertos".