Exercícios simples estimulam o desenvolvimento de bebês com microcefalia

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Exercícios simples estimulam o desenvolvimento de bebês com microcefalia

Ingrid
Publicado em 09/04/2016 às 14:55
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A fisioterapeuta Cynthia Ximenes da Associação de Assistência à Criança Deficiente estimula a pequena Maria Vitória que tem microcefalia.Foto: Sumaia Villela/Agência Brasil

Iara Oliveira Gonçalves, de 23 anos, mãe de Maria Vitória, já tem a almofada-calça em casa. A avó da bebê costurou de presente. Iara se esforça para colocar em prática diariamente cada ensinamento passado pelos médicos. “Para o estímulo visual eu aprendi a colocar coisas coloridas. Por exemplo, pegar uma mamadeira e enfeitar para ela brincar, procurar brinquedinho que faça barulho, colorido, para colocar na frente dela e ver se ela vai acompanhar a visão ou não. Colocar para fazer exercício, colocar ela apoiada na almofada-calça que ensinaram a gente a fazer, que é para ajudar, estimular, botar ela sentadinha, emborcada, ver como vai ter força para segurar o pescocinho, ir se desenvolvendo mais”, diz a ex-manicure, que agora se dedica exclusivamente à filha.

Assim como os objetos usados na fisioterapia, os exercícios também são simples e replicáveis pela família. “A gente ensina as mães como alongar as mãos, as pernas, os braços, os pés, como fazer os exercícios em casa e principalmente proporcionar às crianças as variações de postura durante o dia”, ensina Cynthia. Quem já viu técnicas complexas para a recuperação de atletas ou acidentados pode estranhar, mas a terapia deve acompanhar a idade do paciente, segundo a profissional: “lógico que um bebê de um mês, dois meses a gente não vai colocar para rolar, para sentar, porque nenhum bebê nessa idade está nesta etapa motora. Mas esses posicionamentos são muito importantes lá na frente, para que a gente possar continuar com outros exercícios respeitando a idade e o tempo de cada criança”.

 

DESAFIOS E BENEFÍCIOS- A esses primeiros estímulos em recém-nascidos dá-se o nome de estimulação precoce. A técnica é usada com qualquer criança que apresente fatores de risco, como bebês prematuros, e não apenas os microcéfalos. “A gente começa com a intervenção em uma criança que você sabe que tem risco de ter um problema neurológico antes que apareça. A microcefalia é um sinal, não uma alteração no exame neurológico de força, movimento, desenvolvimento”, diz a neuropediatra Vanessa Van der Linden, gerente médica da AACD. “Ayrton Senna foi um piloto exemplar. Por quê? Ele começou a treinar, treinar e ele usou o potencial dele muito mais do que o pouquinho que a gente usa. A reabilitação é baseada nisso, para desenvolver ao máximo essas conexões que façam com que uma área [do cérebro] ajude a função da outra, porque ela está lesada”.

De acordo com Vanessa, os primeiros encontros com a mãe e o bebê são de diagnóstico, para avaliar as dificuldades e traçar objetivos. “O cérebro controla tudo o que a gente faz. Desde respiração e deglutição, a harmonia do movimento que a gente tem que ter, então dependendo da lesão cerebral relacionada com Zika você pode ter desde alteração visual, alterações neurológicas relacionadas com contato visual, com distúrbio de deglutição. Uma criança que engasga muito e não consegue se alimentar direito pode ter pneumonia e desnutrição”, explica.

Segundo a neuropediatra, cada caso deve ser analisado separadamente, já que as malformações de crianças infectadas pelo vírus Zika são bem variadas – um dos mistérios investigados pelos pesquisadores, inclusive Vanessa. “Tenho pacientes muito graves e outros menos graves. Então a gente vê crianças que tem interação boa, sorriso, que presta atenção, isso já mostra que a criança tem interação com o que está acontecendo com o mundo. Outras estão alheias. Mas o melhor significa o quê? A gente não sabe ainda. É uma doença que está sendo escrita, e temos que acompanhar [os bebês] pelo menos até os dois anos para tentar definir as principais alterações que se vê em crianças desse tipo”, afirma.

Por isso, é importante um acompanhamento atento para verificar, com o tempo e a partir de exames neurológicos, quais os comprometimentos de cada criança. “Lembro que tinha mãe que falava: 'mas doutora, só tem a cabeça pequena'. No entanto, à medida que você necessita que o cérebro comece a comandar e organizar, aí cadê?”, questiona. “Normalmente a gente começa a notar isso com três meses. Dois meses é para [a criança] olhar e não olha direito. É pra sustentar o pescoço com três para quatro meses e não sustenta. Com quatro meses é para começar a usar a mão, e cadê que não usa?”, exemplifica Vanessa.

 

 

A neuropediatra deixa claro, no entanto, que a reabilitação não significa cura das complicações neurológicas. “Reabilitação estimula o potencial que o cérebro tem. A gente não trabalha com 100% do nosso potencial, a gente vai usando aquilo que é estimulado. Quem vai me ensinar que isso é um óculos? A vivência que eu tive, de um dia pegar, alguém mostrar, depois você não precisa nem pensar no significado das coisas”, diz. “A capacidade que o cérebro tem de aprender a gente chama de plasticidade neural. É o que vai fazer com que eu olhe e entenda tudo. Mas para isso você precisa vivenciar. Para uma criança que não tem problema, o ambiente de casa e da escola é suficiente para dar os estímulos necessários. Já para uma criança que tem dificuldade você precisa dar um estímulo bem maior para conseguir um resultado pequena”.

O grau de avanço é diferente dependendo do comprometimento do cérebro, mas mesmo em casos graves Vanessa confirma que é importante levar a sério a terapia. “Mesmo aquela criança muito grave que vai ter pouco desenvolvimento, se você trabalhar com reabilitação vai fazer com que diminua as complicações. Uma delas é deformidade. Uma criança que fica na mesma posição porque está toda durinha, se ela não for manuseada, trabalhada, acaba evoluindo para uma deformidade que agrava o quadro dela. Mesmo para aquela criança que tem pouco potencial, a gente consegue dar uma qualidade de vida melhor para ela”, esclarece.

Apesar de os resultados desse trabalho serem vistos, principalmente, a longo prazo, pequenas conquistas são comemoradas tanto pelas mães como pela fisioterapeuta Cynthia Ximenes. “Nós observamos evoluções a curto prazo. Em um encontro o pescoço estava muito molinho. A mão estava muito fechadinha e com os alongamentos vão abrindo um pouco mais”, exemplifica Cynthia.

Iara também cita, orgulhosa, os avanços observados na filha: “Antes ela não segurava muito bem... ainda não está totalmente segurando o pescoço, mas já vi que ela fica mais tempo com o pescoço levantado, fica brincando com a mão e o pezinho, e antes ela não fazia. Eu fico estimulando em casa, boto o dedo na mão dela, faço força para ela levantar. Já tô vendo que ela está ficando bem mais durinha”, comemora a mãe de Maria Vitória.

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