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A insegurança de quem precisa pegar ônibus no Recife

Cássio Oliveira e Mariana Dantas
Cássio Oliveira e Mariana Dantas
Publicado em 13/10/2015 às 14:51
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Medo é rotina para quem trabalha e para quem usa o coletivo como transporte público  / Fotos: Cássio Oliveira/ NE10

Medo é rotina para quem trabalha e para quem usa o coletivo como transporte público Fotos: Cássio Oliveira/ NE10

À mercê dos bandidos. Essa é a realidade dos cerca de 2 milhões de usuários de ônibus do Grande Recife. Só nos primeiros seis meses do ano, foram registrados 921 assaltos a coletivos – o que representa um aumento de 41,7% em relação ao mesmo período do ano passado. Os dados são da Secretaria de Defesa Social (SDS).

As investidas dos criminosos são cada vez mais violentas, colocando em risco a vida de passageiros, cobradores e motoristas. Os casos mais recentes ocorreram nesse feriadão. Na tarde dessa segunda-feira (12), um arrastão em um ônibus da linha CDU/Boa Viagem assustou passageiros e deixou uma pessoa levemente ferida.

Também no fim de semana, um estudante resistiu à abordagem violenta de um homem dentro do ônibus da linha TI Macaxeira/Tancredo Neves. A vítima se recusou a descer, foi arrastada pela escadaria do ônibus e espancada pelo homem enquanto se segurava na porta do veículo.

Mesmo com guardas nas estações o clima é de insegurança por parte dos passageiros. Para quem depende do transporte coletivo diariamente, não existe opção a não ser conviver com o medo. "Eu raramente vejo guardas nas estações e quando vejo geralmente estão conversando em vez de fazer rondas. Já vi um furto numa estação e nenhum guarda estava presente no momento. No dia, alguns jovens aproveitaram que não tinha segurança, tomaram bolsas e saíram correndo. Por isso nunca me sinto seguro dentro das estações", disse Wilson de Souza, 24 anos.

Na manhã desta terça-feira (13), a reportagem do Portal NE10 esteve no Terminal Integrado da Macaxeira, Zona Norde do Recife, e ouviu relatos de assaltos. Durante a reportagem, uma viatura da Polícia Militar fazia ronda no Terminal e seguranças armados estavam presentes, mesmo assim alguns usuários afirmaram que o receio persiste.

Nem sempre a ameaça está dentro do coletivo. A estudante Kaline Miranda disse que usa o transporte coletivo todos os dias e relatou que foi furtada pela janela do ônibus quando estava saindo do Terminal do Cais de Santa Rita, no Centro. "Já era tarde da noite e tinha que avisar a minha mãe que estava voltando para casa. Quando peguei o celular pra ligar, um jovem se pendurou na janela e tomou meu telefone. Foi muito rápido, fiquei sem reação. Assim que cheguei em casa fiz um boletim de ocorrência online, mas não vi meu celular de novo", disse.

Durante a reportagem, um policial militar, que preferiu não se identificar, contou que já passou por momentos de terror dentro de um ônibus que faz a linha Dois Irmãos (Rui Barbosa). “Eu estava no ônibus quando dois rapazes, bem vestidos, anunciaram o assalto. Como alguns passageiros não prestaram atenção pensando que era alguma brincadeira, um deles ficou com raiva e deu um tiro para cima. Daí todos entraram em pânico. Os rapazes levaram o dinheiro que estava com o cobrador e desceram em seguida sem assaltar as pessoas, mas o nervosismo dentro daquele ônibus foi impactante”, ressaltou o militar.

Rodoviários reclamam da falta de policiamento

Rodoviários reclamam da falta de policiamentoFoto:Cássio Oliveira/ NE10

MOTORISTAS E COBRADORES –
O medo também é um sentimento constante entre os profissionais que atuam no coletivo. O cobrador de ônibus Eduardo Rodrigues, 33, contou como foi um dos assaltos que já sofreu. "Estava trabalhando na linha TI Macaxeira (AV. Norte) quando dois homens adultos entraram no coletivo, um me abordou e anunciou o assalto enquanto o outro recolheu os pertences do usuários. Chegamos a prestar queixa, mas de nada adiantou. É um absurdo essa falta de segurança", disse.
 
“Trabalhei como motorista de ônibus no Grande Recife e tive a infelicidade de ser surpreendido por três assaltantes enquanto dirigia. Isso tem que acabar”, também denuncia Eduardo Amaral, que deixou seu depoimento na ferramenta colaborativa Comuniq, do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação (SJCC). Durante transmissão no Periscope do NE10 sobre o tema, o motorista Othon Kléber falou sobre dois assaltos que sofreu e criticou a eficácia das câmeras de segurança dentro dos coletivos:


 
Para o Sindicato dos Rodoviários, a falta de assistência policial é um dos principais motivos para esse número elevado. “Não existe linha de ônibus mais perigosa do que outra, e sim a facilidade que os bandidos encontram em vários locais da cidade onde não existe policiamento”, afirma o assessor de Comunicação do sindicato, Genildo Pereira.

No último mês de agosto, a categoria realizou um protesto na Avenida Sul, na Zona Sul do Recife, para denunciar os assaltos frequentes a ônibus na avenida. “Os bandidos praticavam em média cinco assaltos por dia nessa avenida. Após o protesto, o policiamento melhorou um pouco”, afirma Genildo, acrescentando que via temida pelos motoristas é a 2ª Perimetral, em Olinda, no Grande Recife.
 
SEGURANÇA – De acordo com a Polícia Militar, a segurança nas paradas de ônibus do Grande Recife e áreas próximas é realizada pelo efetivo das Patrulhas dos Bairros, em rondas diárias. Já as ações de prevenção dentro dos coletivos fazem parte operação Transporte Seguro. “Fazemos pontos de bloqueios em áreas com maior incidência de assaltos e todos os ônibus que passam pelo bloqueio são abordados. A aceitação da população é bastante positiva. Nos últimos 30 dias, quatro prisões foram realizadas durante a operação”, afirma o major Julio Aragão.
 
Já o sindicato Urbana PE afirmou que fez um investimento de R$ 8 milhões em câmeras de vídeo, além de cofres nos veículos e sistema de GPS. “Temos estimulado a utilização de cartões eletrônicos para pagamento das passagens, de maneira a reduzir o montante de dinheiro a bordo, mas o percentual de pagantes em espécie ainda é relevante, o que, acreditamos, torna o assalto ao coletivo mais atrativo”, afirmou a assessoria do Sindicato.
 
Ainda de acordo com a Urbana PE, desde 2007 a frota é equipada com câmeras de segurança e entre 2007 e 2013 houve redução de 65% no total de assaltos realizados nos ônibus. A assessoria informou que, atualmente, 100% da frota conta com câmeras de segurança e equipamentos de monitoramento como o GPS.

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