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Faça login ou cadastre-seOnze em cada dez pessoas que sabem dos planos, meus e de Vanessa, de ir estudar fora do país perguntam "E o cachorro? Vão fazer o que com ele?". O cachorro é Luke, um lhasa apso de dois anos e dois meses que adotamos quando tínhamos menos de um ano de casados e que colocou nossa vida de cabeça para baixo.
Costumo achar graça da pergunta, mas entendo que ela não é feita por ignorância, maldade ou qualquer razão pouco nobre. É uma dúvida legítima que já passou pela cabeça do meu sogro, da minha mãe e de amigos queridos e que talvez eu mesmo tivesse no passado quando bicho de estimação era algo que estava nas últimas colocações na minha lista de prioridades.
Acho que a única pessoa que não fez nenhuma pergunta sobre o destino de Luke foi minha sogra. Talvez por ser uma das principais incentivadoras dos nossos planos e saber de cada passo nosso desde o início ou por amá-lo como nós o amamos. Se tivéssemos que deixar Luke para trás por alguma razão, ela certamente seria a pessoa ideal para ficar com ele, mas essa é uma possibilidade que nunca cogitamos.
Quando digo 'nunca cogitamos' quero dizer que uma das primeiras medidas acordadas foi de que só avançaríamos no processo de mudança caso não houvesse nenhum obstáculo que nos obrigasse a deixar Luke aqui. Algumas pessoas entendem e outras não conseguem esconder o letreiro luminoso na testa com a frase CÊS SÃO LOUCOS?
Às vezes acho que somos mesmo tamanhos os gastos e burocracia para Luke viajar conosco. O mais fácil, em teoria, seria arrumar um lar para ele aqui, tocar o barco e tentar confortar o coração com as boas lembranças que tivemos. Luke é um cachorro dócil, tranquilo, carinhoso e certamente se adaptaria a qualquer lugar desde que recebesse amor, fosse levado para passear e ganhasse sua dose diária de ração e água. Mas e nós?
Bem, nós aprendemos que a companhia de Luke compensa qualquer gasto que já tivemos e que ainda vamos ter. Nunca deixamos de fazer nada, incluindo viajar, por conta dele. Apenas tivemos que adaptar planos e orçamentos, em resumo, nada que tenha gerado infelicidade.
Até Luke surgir, nunca me senti dono (ou tutor para usar uma expressão 'moderna') de um cachorro mesmo convivendo com alguns deles em casa quando ainda morava com minha mãe. Depois de velho, e sei lá a razão, adquiri um medo absurdo de cães, de qualquer raça ou tamanho, tivessem eles disposição ou não para latir ou morder.
Em uma das primeiras consultas médicas de Luke da qual participei, quis saber da veterinária como seria a relação entre mim e ele já que o meu medo não facilitava em nada a adaptação (dele à casa e minha a ele). Ela me disse que eu não teria medo dele simplesmente porque, a partir de então, Luke era meu filho.
Segurei o riso para não ser mal-educado, mas achei aquilo absurdo. Filho é filho e cachorro é cachorro. E Luke era um cachorro que não teria entrado em um casamento recém-iniciado se dependesse só de mim [já deu para sentir o quanto queimei a língua]. Vieram então choros e ganidos de madrugada, cocô pela casa toda e um cheiro de leite que tomava conta da cozinha e área de serviço e pensei que talvez fosse isso o que a veterinária quis dizer quando falou na relação pai e filho: tinha um ser vivo, de quatro patas e peludo, que necessitava do meu carinho e atenção para se desenvolver.
Fui perdendo o medo de Luke - um medo ridículo de um homem do meu tamanho em relação a um cachorro que entrou em casa com tamanho um pouco maior que minha sandália [calço 41] -, porém continuava a achar esse lance de pai e filho uma forçada de barra enorme. Ele seria, no máximo, um bom amigo canino.
O tempo passou e o entendimento mudou. Luke continua sendo um cachorro, mas é bem mais do que um cachorro. Dificil de entender? Para nós não. Quando me perguntam se Luke vai viajar comigo no dia em que eu colocar os pés para morar fora do Recife, respondo com orgulho:
- Claro. Luke é filho e não se deixa um filho para trás.
É um filho que talvez um dia ganhe outro irmão de quatro patas ou um irmão humano. Aqui em casa, seja lá onde estejamos, não nos preocupamos com o que as pessoas acham ou certas convenções sociais e só temos um objetivo: expandir o amor da forma como a gente entender melhor.
Luke é filho e um filho não fica para trás Foto: Arquivo pessoal