#IceBucketChallenge

ELA: a doença que está por trás do #DesafiodoBaldedeGelo

Marília Banholzer
Marília Banholzer
Publicado em 22/08/2014 às 9:06 | Atualizado em 01/12/2022 às 15:33
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A ELA causa a degeneração progressiva no primeiro neurônio motor superior no cérebro e no segundo neurônio motor inferior na medula espinhal / Foto: reprodução

A ELA causa a degeneração progressiva no primeiro neurônio motor superior no cérebro e no segundo neurônio motor inferior na medula espinhal Foto: reprodução

Entre as reações fisiológicas do corpo humano ao sentir muito frio estão rigidez dos músculos, dificuldade de respirar e falar, tremores. Esses são os mesmos sintomas da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), doença degenerativa do sistema nervoso que deu "início" ao #IceBucketChallenge, ou #DesafiodoBaldedeGelo como é chamado no Brasil. A proposta da campanha, criada através da Associação Americana de ELA (ALSA), é desafiar as pessoas a sentirem o que os portadores desse mal sentem ou realizarem doações em dinheiro para institutos que estudam a doença. A causa é considerada tão nobre que as pessoas têm tomado o banho gelado e, mesmo assim, feito doações.

É com pesar que especialistas na área de neurologia decretam: a ELA ainda não tem cura. E pior: de acordo com a neurologista recifense Silvia Laurentino, o número de pessoas diagnosticadas com esse mal só faz crescer. "Ainda não se sabe o que causa esse tipo de esclerose, se é o estresse, a alimentação cheia de agrotóxicos, sabe-se apenas que os neurônios motores estão sendo afetados e cada vez mais pessoas têm aparecido com essa doença", avaliou. Outra realidade triste desse mal é que, após diagnosticado, o paciente chega ao ápice da doença com no máximo quatro anos. O reflexo é ficar sem respirar, sem ingerir alimentos, sem se mover, sem falar, dependendo de aparelhos hospitalares para respirar.

Ela passou cerca de dois anos tentando sobreviver com ajuda de aparelhos, mas não conseguiuDiney Giori

No Brasil, em torno de 2.500 pessoas são diagnosticadas com ELA anualmente. A incidência em território brasileiro, assim como nos Estados Unidos, está entre duas a quatro pessoas a cada 100 mil. Hoje, estima-se que mais de 15 mil brasileiros sejam portadores deste mal. Outro dado curioso desta doença: 90% dos casos não têm relação com histórico familiar. E mais, em geral a ELA afeta pessoas com idades entre 35 e 60 anos, sendo os homens, historicamente, os mais afetados.

Pode parecer uma doença tristemente fatal como a Aids ou muitas outras que vêm sendo estudadas pelos cientistas do mundo. No entanto, a Esclerose Lateral Amiotrófica causa incômodo na sociedade médica por não trazer respostas conclusivas. Por exemplo, quase 165 anos depois do primeiro caso clinicamente confirmado na história, ainda não se sabe como a doença surge, como evitá-la, se há relações hereditárias, qual é a cura ou pelo pelos um medicamento que melhore a qualidade de vida dos pacientes.

Na família do encarregado de obras, Diney Giori, 35 anos, morador da cidade de Jaguaré, no Espírito Santo, pelo menos seis pessoas já foram diagnosticadas com a doença em um período de 20 anos. Na maioria dos casos, os pacientes morreram cerca de um ano após o diagnóstico. "A única que viveu por mais tempo foi a minha prima que morreu há cerca de três anos. Ela passou cerca de dois anos tentando sobreviver com ajuda de aparelhos, mas não conseguiu", relembrou ele que chama a doença de "maldita" e "destruidora de vidas".

Cerca de 90% dos casos da doença não têm relação com histórico familiar

Diney confirmou que tem medo de desenvolver a ELA já que a doença é tão presente em sua família, mas disse que tenta não pensar sobre isso, pois acredita que o desequilíbrio emocional pode ser um dos gatilhos para o início dos sintomas. "Lembro que minha mãe começou com os sintomas após um grande aborrecimento", relatou. "Essa doença é muito triste. Os exames são muito dolorosos para os pacientes. A convivência é muito difícil para os familiares. Quando a minha mãe foi diagnosticada e o médico me chamou pra conversar, a nossa reação foi chorar. Quatro pessoas da nossa família já tinham morrido por causa da Esclerose Lateral Amiotrófica", disse Diney.

Diney e a mãe (centro) em momento anterior ao diagnóstico da doença

Diney e a mãe (centro) em momento anterior ao diagnóstico da doençaFoto: acervo pessoal

Para a neurologista Silvia Laurentino, todas as tentativas de arrecadar fundos para estudar a doença com mais profundidade é válida, inclusive o Desafio do Gelo. "É preciso descobrir uma forma de dar qualidade de vida para os pacientes. Atualmente, há apenas uma droga chamada riluzol, que é fornecida pelo SUS, mas ela só aumenta a expectativa de vida em quatro ou cinco meses", avaliou a especialista.

No Recife, os pacientes diagnosticados com esse mal devem procurar os centros especializados em neurologia como os que funcionam no Hospital das Clínicas, ligado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), localizado na Cidade Universitária, ou no Hospital da Restauração, no Derby. Os dois serviços são públicos. No Brasil, há a Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica (ABrELA), que recebe doações financeiras através da seguinte conta bancária:

Banco Bradesco (237)
Agência: 2962-9
Conta corrente: 2988-2
Razão Social: Associação Pró-Cura da Esclerose Lateral Amiotrófica
CNPJ: 18.989.225/0001-88


Nos EUA, a ELA é conhecida como doença de Lou Gehrig, atleta americano que morreu em 1903 com o mal degenerativo

Nos EUA, a ELA é conhecida como doença de Lou Gehrig, atleta americano que morreu em 1903 com o mal degenerativoFoto: arquivo

A CAMPANHA DO GELO - Uma iniciativa da ALS Association, a campanha #IceBucketChallenge já arrecadou US$ 31, 5 milhões no período de 29 de julho a 20 de agosto. O processo consiste em desafiar 3 pessoas a fazerem uma doação de US$ 100, e caso não o façam, devem tomar um banho com um balde de água com gelo, tudo em 24h. Como a visibilidade de celebridades tomando banhos de água gelada foi grande demais, optou-se por fazer os dois, e assim, divulgar ainda mais a causa. A brincadeira ganhou repercussão internacional após famosos como Mark Zuckerberg, Bill Gates, Cristiano Ronaldo, Justin Timberlake, entre outros, publicarem vídeos em que derrubavam um balde de gelo sobre suas cabeças.

“Claro que sabemos que a realidade do Brasil é outra, mas com o apoio das celebridades, podemos vislumbrar um futuro melhor para os pacientes que são assistidos pela Associação” afirma Jorge Abdalla, vice- presidente da Associação Pró-Cura da ELA. “Enquanto lá fora eles buscam recursos para pesquisas e pela busca da cura da doença, aqui buscamos recursos mínimos para praticar o assistencialismo, para que os pacientes mais necessitados tenham um pouco de conforto e dignidade até que seja descoberta a cura da doença” complementou.