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Acusado de canibalismo descreve ritual de morte das vítimas

Amanda Miranda
Amanda Miranda
Publicado em 13/11/2014 às 17:01
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Em seu depoimento, Jorge disse que comer carne da vítima fazia parte do ritual de purificação  / Foto: Hélia Scheppa/JC Imagem

Em seu depoimento, Jorge disse que comer carne da vítima fazia parte do ritual de purificação Foto: Hélia Scheppa/JC Imagem

A morte da moradora de rua Jéssica Camila, em 2008, fez parte de um ritual de purificação da seita O Cartel, criada pelos três réus que ficaram conhecidos como "canibais de Garanhuns", julgados nesta quinta-feira (13), em Olinda, na Grande Recife. Em seu interrogatório, Jorge Beltrão Negromonte da Silveira, 52 anos, que confessou o crime pela primeira vez em juízo esta tarde, deu detalhes da prática adotada por eles. Segundo o acusado, o primeiro entre os três a falar ao júri, o crime foi considerado a primeira missão prevista na seita "O Cartel".

"A seita foi criada por mim, por Bel (como se refere à acusada Isabel Cristina, 53) e por Bruna (a terceira ré, Bruna Cristina, 28). Nos reunimos e criamos o ponto x, O Cartel. Já há muito tempo tinha falado isso com uns amigos, de fazer uma seita para ajudar as pessoas", disse Jorge em sua confissão - apesar de depois ter afirmando ao advogado de Bruna, Rômulo Lyra, que só teve as ideias após conhecê-la. 

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O grupo, denominado dessa forma por se referir à organização dos três, tinha os objetivos de controle populacional, matando pessoas incapazes nos sentidos profissional e reprodutor. Apontado ao longo das investigações como líder do trio, Jorge se defendeu afirmando que tudo era combinado entre os três. "Bruna apoiava e sempre chegava com requisitos, como a explosão demográfica, contra essas pessoas que têm filhos 'por ter' (sem condições de criá-los), e as crianças ficam sofrendo", acusou.

De acordo com o relato de Jorge, o crime contra Jéssica foi premeditado por, aproximadamente, quatro meses, mas nenhum dos três tinha coragem de cometê-lo até o dia em que Jéssica quis sair de casa (ela era mantida em cárcere privado). O acusado contou que, ao perceber isso, usou uma faca entregue por Isabel para desferir um golpe de faca no pescoço da vítima, que morreu na frente da filha de um ano, nos braços da sua esposa. Em seguida, Jéssica foi arrastada e esquartejada. "Foi uma única facada. Quando levei Jéssica para o banheiro, junto com Bruna, ela não estava mais viva. Eu verifiquei", disse Jorge.

A vítima era chamada pelo réu de "adolescente do mal". "Segundo a seita, se a pessoa se arrepender dos pecados, vai ser aceita (no céu). Perguntei a ela: Você vai se arrepender de todos os seus pecados. Ela disse que sim", contou sobre o momento em que Jéssica estava imobilizada por Bruna e já ameaçada por ele com a faca.

A missão, segundo o acusado, foi de purificação da jovem e comê-la ajudava a cumprir esse objetivo. "(Jéssica) era um animal humano, só que precisava ser purificada", disse. "Não deixais cadáveres sobre o mundo", dizia o livro sagrado de O Cartel.

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Jorge Beltrão Negromonte é um dos acusados - Luiz Pessoa/ NE10
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População acompanha chegada de acusados - Luiz Pessoa/ NE10
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Juíza Maria Segunda está à frente do caso - Luiz Pessoa/ NE10
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Paulo Sales, advogado de Isabel Cristina, uma das acusadas - Luiz Pessoa/ NE10
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Promotora Eliane Gaia participa do julgamento - Luiz Pessoa/ NE10
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Jorge Beltrão Negromonte é um dos acusados - Luiz Pessoa/ NE10
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Tereza Joacy (de cabelo curto), defensora pública de Jorge Beltrão - Luiz Pessoa/ NE10
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Isabel Cristina é esposa de Jorge Beltrão e também acusada - Luiz Pessoa/ NE10
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Bruna Cristina Oliveira da Silva completa o trio de acusados de canibalismo - Luiz Pessoa/ NE10
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Júri popular acontece no Fórum de Olinda - Luiz Pessoa/ NE10
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Jorge Beltrão Negromonte é um dos acusados - Luiz Pessoa/ NE10
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Isabel Cristina é esposa de Jorge Beltrão e também acusada - Luiz Pessoa/ NE10
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Bruna Cristina Oliveira da Silva completa o trio de acusados de canibalismo - Luiz Pessoa/ NE10
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Trio é acusado de matar, esquartejar e comer a carne do corpo de Jéssica Camila da Silveira Pereira, em maio de 2008. - Luiz Pessoa/ NE10
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Delegado que conduziu o inquérito Paulo Berenguer - Luiz Pessoa/ NE10
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Psiquiatra forense Lamartine Holanda descartou distúrbio mental nos acusados - Luiz Pessoa/ NE10
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Os acusados confessaram os crimes durante as investigações da Polícia - Luiz Pessoa/ NE10
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Canibais são acusados de mais dois assassinatos em Garanhuns - Luiz Pessoa/ NE10
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Após o assassinato de Jéssica, Bruna assumiu a identidade dela - Luiz Pessoa/ NE10
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O trio passou a criar a filha da vítima - Luiz Pessoa/ NE10

Para a seita, a perna remetia ao fogo e à terra; os braços, à água e ao ar; a cabeça, a Deus. Assim, as carnes dos membros superiores e inferiores eram os mais aproveitados no canibalismo. "O tronco foi enterrado em local sagrado (uma sala portuguesa dentro da casa onde moravam) e depois desenterrado. Foi envolvido em pares e levado com muito cuidado por nós", afirmou. "Não queria que os pés imundos pisassem sobre a tumba dela", contou depois. A cabeça de Jéssica foi colocada no quintal para proteger olugar tido como sagrado por eles.

O esquartejamento de Jéssica foi feito após todo o seu sangue escorrer, o que foi provocado com o corte na veia jugular. "Segundo a Bíblia, não devemos utilizar o sangue. O sangue não é puro", argumentou. A pele também era considerada impura, então era separada da carne que seria comida - dos braços e das pernas. "Era um ritual exigido. A carne era cozinhada na água e depois junto com verduras e temperos normais", relatou Jorge. Os restos mortais de Jéssica foram congelados na geladeira da casa e também foram inseridos na dieta da filha da vítima, que passou a morar com o trio. 

Após essa primeira morte, considerada uma missão, foram realizadas mais duas, em Garanhuns, no Agreste pernambucano, segundo o depoimento dele no júri popular. A quarta missão seria concretizada também no município localizado no interior do Estado. Segundo o acusado, foi suspensa pouco antes do dia em que o trio foi preso. "Me arrependi pelo que fiz. Estou orando a Deus, pedindo perdão pelo que fiz. Não é o ser humano que decide, é Deus que vai saber se vou para o céu ou o inferno", afirmou o acusado, que sempre frequentou cultos, desde mórmons a adventistas.

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