Comportamento

O mal vestido de mulher

NE10
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Publicado em 03/09/2010 às 15:30
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“Ela é envolvente, sedutora. Com os homens, é carinhosa, gentil, tudo o que eles gostam. Tem a fala meiga, voz mansa, aparência de pureza”.

É assim que a delegada Silvana Lelis, responsável pela investigação do assassinato do professor universitário Paulo Augusto Sperança, descreve a acusada pelo crime, a esposa da vítima, Ana Terezinha Zanforlin. Atributos como os que foram citados pela delegada, ligados à feminilidade, costumam ser atrativos das mulheres na hora da conquista. Mas essas qualidades podem ser utilizadas com outros objetivos, como foi o caso de Ana Terezinha, que, segundo a polícia, usou a sedução como ferramenta para executar um plano friamente arquitetado.

Ela não foi a única mulher a ser indicada como responsável por um caso de assassinato de grande repercussão nos últimos meses em Pernambuco. No início do ano, Delma Freire foi apontada como mentora do assassinato da nora, alemã Jennifer Kloker. Mais recentemente, foi descoberto que a administradora Narda Biondi teria sido morta pelas mãos de Sayonara Boner, dona na casa de quem estava hospedada. Essas mulheres, em especial Ana Terezinha e Delma, têm mostrado que frieza e calculismo, atributos comumente associados ao sexo masculino, são comuns a ambos os sexos.

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Em casos extremos como os dessas duas mulheres, tais características são consideradas sintomas do que os especialistas chamam de “Transtorno de personalidade”. De acordo com o psicólogo Carlos Ferraz, os casos podem ser diagnosticados como psicopatias. “Faz parte desse transtorno a falta de sentimentos como compaixão e culpa. Essas pessoas normalmente são manipuladoras e egoístas e não sentem remorso. O que vemos nesses casos é uma grande frieza, tanto no planejamento quanto na execução do crime, e também no pós-crime”, afirma.

“Homens com esse tipo de transtorno também são capazes de envolver as pessoas para conseguir o que querem, mas, sendo mulheres, os casos podem ganhar peculiaridades do universo feminino, como a meiguice e a encenação de uma suposta fragilidade, despertando nos outros o instinto de proteção. Além da sedução erótica, podem também seduzir através da compaixão ou pena”, explica Ferraz. Esses fatores, de acordo com Silvana Lelis, teriam estado presentes na relação entre o professor Sperança e sua esposa: “Paulo desconfiava dela, mas ela conseguia infiltrar a dúvida e agia de forma que o fazia querer protegê-la. Ela disse que estava com câncer e agia como se o amasse. Ele não era burro, mas ela era muito engenhosa”, relata a delegada.

Como parte do seu plano, Ana Terezinha também, segundo a polícia, seduziu o segurança Júlio Neto e planejou com ele os atentados contra o marido, incitando-o a cometer o assassinato. O segurança foi usado na primeira tentativa de matar o professor, em dezembro de 2009. “A relação amorosa dos dois começou em outubro. Ela passou para ele uma ideia distorcida de Paulo Sperança e chegava a forjar situações, rasgando a própria roupa e dizendo que o marido a teria atacado”, relatou Silvana Lelis.

“Pessoas com transtornos como esse são muito inteligentes, são capazes de raciocínios profundos. Por isso dizemos que estão em uma espécie de zona fronteiriça entre a 'normalidade' e a doença mental”, observa Feliciano Lima, psiquiatra do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, localizado em Itamaracá. “O transtorno de personalidade que encontramos nos homens também é encontrado nas mulheres, mas é muito menos comum. Fico até admirado quando vejo esses casos de mulheres que arquitetaram assassinatos de forma tão fria”, observa.

O psiquiatra aponta também que, quando são responsáveis por crimes como esses, a atuação das mulheres costuma ser diferente da dos homens: “As mulheres em geral não têm tanta coragem de tomar elas mesmas atitudes graves, agressivas. É mais comum estarem envolvidas do que assumirem as coisas por si só”.

Carlos Ferraz concorda: “Muitas vezes as mulheres, por falta de força física, se utilizam de artifícios mais sedutores e inteligentes para executar planos como esses”. Teria sido o caso de Delma e Ana Terezinha, que, de acordo com as investigações, fizeram planos minuciosos para que outras pessoas cometessem os assassinatos no lugar delas.

Silvana Lelis considera que as mulheres costumam ser melhores que os homens na “arte de mentir”. “Ana Terezinha aparentava ser meiga, pudica, e conseguia transmitir amor, atenção, carinho, mas era tudo falso. Chegar ao ponto de seduzir um homem somente para que ele mate alguém para você é de uma extrema sensibilidade às avessas”, conclui a delegada.

“Essas pessoas só pensam em si mesmas e, quando demonstram tristeza em relação ao que fizeram, ou estão sendo falsas ou estão apenas preocupadas com o que vai acontecer com elas”, afirma Feliciano Lima.

Dessa forma, no pós-crime elas seguem fingindo, para que as suspeitas não caiam sobre elas. Um exemplo disso seria Delma Freire, que depois da morte de Jennifer, chegou a mandar fazer uma camiseta com a foto da alemã e os dizeres: “Por onde quer que eu vá eu vou te levar para sempre.” “Delma sempre se fez de vítima; ainda se faz. É totalmente dissimulada. O comportamento dela mudava de acordo com a situação, com o que fosse mais conveniente para ela”, diz Gleyde Ângelo, delegada responsável pelo caso Jennifer.

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