Dia do Rock

O camaleônico Rock and Roll lançou tendências e refletiu comportamentos

Wladmir Paulino
Wladmir Paulino
Publicado em 13/07/2016 às 7:05
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Ousadia de Elvis fez os brancos consumirem música para negros / Foto: Diuvulgação.

Ousadia de Elvis fez os brancos consumirem música para negros Foto: Diuvulgação.

Não existe um sistema métrico que possa dimensionar o impacto do rock na sociedade desde que Elvis Presley gravou o compacto That's All Right, Mamma em julho de 1954. Mas é possível identificar várias consequências - para o bem e para o mal - que mostram o tanto como o ritmo musical mais popular do planeta está presente no nosso cotidiano. Entre lançamentos de tendências e reflexos de comportamentos, talvez seja esse o maior recado do bom e velho rock and roll: goste-se ou não dele, estará sempre por aqui, seja em violões e baixos feitos de tábua de passar roupa ou num algoritmo de computador.

Ao embarcarmos nesta viagem, podemos lembrar do primeiro e, provavelmente mais importante, recado do rock: o fim da segregação racial. Assim como o blues e o jazz, tem a cor negra em seu DNA. Numa época em que o preconceito racial proibia negros e brancos de frequentarem os mesmos lugares, a musica uniu como as leis e a religião jamais conseguiram fazer. Os escravos trouxeram uma base rítmica constante e repetitiva e a expressão de suas emoções - incluindo aí as agruras do cativeiro. Esses princípios formaram as bases do Blues e do Rhythm and blues, os pais do futuro ritmo.

VEJA ÁLBUNS QUE REFLETIRAM COMPORTAMENTOS DE SUAS ÉPOCAS

E onde entra o racismo na história? Quando apareceu na televisão com o rebolado insinuante e a voz negroide, Elvis Presley foi aceito - primeiro com ressalvas pela dança - por ser branco, bonito e, claro, talentosíssimo. Bem diferente de Chucky Berry, Litte Richard e Fats Domino, todos com a cor escura da pele em comum. Ele mesmo fez a defesa dos irmãos. "Os negros vêm cantando e dançando dessa forma há muito tempo", disse.

Uma confusão com o DJ Shelley Stuart, na cidade de Bessemer, em 1960 foi emblemático para a quebra do preconceito. Ele tocava a "música de negros" para cerca de 800 pessoas, todas brancas, num clube. Dezenas de membros da Ku Klux Klan, famosa e temida seita racista, cercaram o local para massacrar o disc jóquei. Para evitar o mal maior ele avisou ao público que iria parar o show mas não contava que todos que o ouviam se rebelaram e partiram para cima dos agressores. Brancos lutaram contra brancos para ouvirem música de negros. Os movimentos que lutavam contra a segregação ganhariam fôlego a partir dos anos 1960.

SÍMBOLO DE REBELDIA - Na década seguinte, o rock consolidou-se definitivamente na cultura popular. Os Beatles romperam qualquer tipo de barreira com ternos bem cortados e cabelos compridos - para os padrões da época - e, principalmente uma qualidade musical que atingiu um patamar até então inimaginável para um estilo visto de forma tão marginal, como bem atestou Frank Sinatra uma vez. "Rock’n’roll é a coisa mais brutal, feia e degenerada que eu já tive o desprazer de ouvir", disse 'A Voz'.

E, mais uma vez, ele seguiu metamorfoseando-se sempre sintonizado com o que acontecia à sua volta. A década que começou feliz e esperançosa terminaria melancolicamente agressiva com a Guerra do Vietnã e os assassinatos de Martin Luther King Jr e Che Guevara. No rock, a influência das drogas ficou mais forte trazendo um ar mais dark e político à música. Jim Morrison (The Doors) foi preso por mostrar a genitália ao público num show em Miami, um jovem negro (Meredith Hunter) foi assassinado a facadas pelos Hell' Angels, gangue contratada para fazer a segurança dos Rolling Stones no fatídico show em Altamont e os Beatles entraram num processo de auto-destruição que culminaria com uma traumática separação em 1970.

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Esse clima de persona non grata invadiu toda década de 1970. Roqueiro, que era sinônimo de rebeldia dez anos antes pelo comprimento dos cabelos e roupas extravagantes entravam nos obituários ou páginas policiais. Os já citados Rolling Stones fugiram para a França para não pagar o caminhão de impostos que a coroa inglesa gostava de cobrar. Entre setembro de 1970 e julho de 1971 Janis Joplin (overdose de heroína), Jimi Hendrix (overdose de barbitúricos) e Jim Morrison (parada cardíaca consequente de muito consumo de heroína) partiram desta para uma melhor. A violência atingiria níveis ainda mais altos a partir de 1976 com a explosão do movimento punk, criado no Reino Unido na butique de Malcom McLaren e sua então namorada Vivienne Westwood. Embora o visual fosse esteticamente planejado em todos os detalhes, o comportamento dos punks era completamente fora de controle, consequência das altas taxas de desemprego e recessão econômica da Inglaterra de Margareth Tatcher.

Isolando-se o clima de ebulição social e econômica, a qualidade da música atingiu níveis ainda maiores, caminhando com a tecnologia também ascendente. Entrava em cena o rock progressivo, capitaneado pelos experimentos do Pink Floyd, King Crimson e Genesis. O niilismo punk destruiu o experimentalismo progressivo com músicas de três acordes e cusparadas, literal e metaforicamente, nos valores da socidade.

MISTURAS - Embora as fusões de ritmo sempre tenham feito parte do rock - o próprio gênero nasceu disso - ele passou por um nível mais forte de osmose a partir da década de 1980. Uniu-se ao hip hop. O pós-punk deu lugar a Era Disco. Vivia-se o auge das boates, ou clubes. A influência eletrônica intesificou-se e a música de protesto do final da década anterior ganhou mais ares de entretenimento.

Isso até chegar uma nova onda e injetar guitarra, baixo e bateria de volta aos amplificadores. As bandas de heavy metal do início dos anos 1980 deixaram os teclados de lado e usaram uma pegada mais clássica. O exemplo mais popular foi o Guns N' Roses com seus 13 milhões de cópias de Apettite For Destruction, seu álbum de estreia. A pegada básica ganhou outras ramificações nos anos 1990 aumentando ainda mais o intercâmbio tanto de estilos quanto de presente e passado. Uma consequência direta das distâncias cada vez menores que a internet oferecia ao mundo. O mundo ainda era um lugar inóspito com a longa guerra entre Irã e Iraque, a invasão russa ao Afeganistão e a Guerra do Golfo. Também marcou o mundo o esmagamento do capitalismo sobre o socialismo com a abertura e consequente desmantelamento da União Soviética.

Nos EUA o movimento grunge deixou um pouco da velocidade do metal mas manteve a distorção das guitarras, como Alice in Chains e Soundgarden. A batida simplificada do punk ganhava um tom mais pop e menos politizado com as músicas de Green Day e Offspring. Embora planeta estivesse cada vez mais próximo, a viagem do rock voltava-se mais para o eu. Bandas com uma postura mais independente, ou indie rock, deram o tom dos anos 2000, como Radiohead, Strokes e Belle & Sebastian. Muitas delas terminaram engolidas pelo mainstream. A década atual, ainda em curso reflete a igualdade cada vez mais buscada, mas ainda longe do ideal, da igualdade entre gêneros. Ao menos na música, nomes como Adele Kate Perry e Rihanna dominam os ouvidos dos adolescentes.

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